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DOCUMENTO 1
 
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Processo:
0010821-63.2024.8.16.0014
(Decisão monocrática)
Segredo de Justiça: Não
Relator(a): joeci machado camargo 1 vice
Órgão Julgador: 1ª Vice-Presidência
Comarca: Londrina
Data do Julgamento: Tue Jul 02 00:00:00 BRT 2024
Fonte/Data da Publicação:  Tue Jul 02 00:00:00 BRT 2024

Decisão Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Decisão monocrática. Eventuais imagens serão suprimidas.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ
1ª VICE-PRESIDÊNCIA

Autos nº. 0010821-63.2024.8.16.0014

Recurso: 0010821-63.2024.8.16.0014 Pet
Classe Processual: Petição Criminal
Assunto Principal: Contra a Mulher
Requerente(s): EDUARDO DE GODOY CINTRA JUNIOR
Requerido(s): CLAUDIA FARIA BEDIN

MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ
EDUARDO DE GODOY CINTRA JUNIOR interpôs tempestivo recurso especial, com fundamento no artigo
105, inciso III, alíneas “a” e “c”, da Constituição Federal, contra os acórdãos proferidos pela 1ª Câmara
Criminal deste Tribunal de Justiça.
Alegou o Recorrente, divergência jurisprudencial e violação dos artigos 129, § 9º, do Código Penal; 5º, inciso
III, e 7º, inciso II, da Lei nº 11.340/06; 155, 156 e 386, inciso VII, do Código de Processo Penal; e 335 do
Código de Processo Civil, sustentando: a) que a Corte Estadual se utilizou de convicções íntimas, sem
respaldo nas provas dos autos para a sua condenação, notadamente, as testemunhas oculares (fato 02) e
inexistência de declarações da vítima sobre o fato 04; b) que houve a inversão do ônus probatório; e, c) a
sua absolvição, ante a insuficiência de provas e a atipicidade da conduta.
Pois bem.
Inicialmente, o recurso revelou-se deficiente em sua fundamentação, já que não se pode, em sede de
especial, simplesmente impugnar o entendimento esposado pelo órgão julgador, como se de mera apelação
se tratasse, sem ao menos procurar demonstrar efetivamente como os artigos 5º, inciso III, e 7º, inciso II, da
Lei nº 11.340/06, e 335 do Código de Processo Civil foram violados pelo Colegiado, ensejando, assim, a
aplicação da Súmula 284 do Supremo Tribunal Federal (“É inadmissível o recurso extraordinário, quando a
deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia”).
Destaca-se, a propósito, a seguinte decisão do Superior Tribunal de Justiça:
“Revela-se deficiente a fundamentação do recurso quando a arguição de ofensa ao
dispositivo de lei federal é genérica, sem demonstração efetiva da contrariedade,
aplica-se, por analogia, o entendimento da Súmula n. 284, do Supremo Tribunal
Federal” (AgInt no REsp n. 2.004.807/SP, relatora Ministra Regina Helena Costa,
Primeira Turma, julgado em 14/11/2022, DJe de 17/11/2022).
Além disso, extrai-se os seguintes fundamentos do acórdão impugnado, senão vejamos:
“Vê-se que a decisão a objurgada, trouxe em seu bojo, todos os aspectos
levantados pelo embargante, restando evidente o intuito de revisão do mérito por
parte do mesmo. Assim, reproduzo parte do julgado (mov. 89.1 – Autos de
Apelação):
‘a) ”Do exame de todos os elementos constantes dos autos, acima apreciados
pormenorizadamente, verifica-se que as declarações prestadas pela vítima em
relação aos crimes de lesão corporal contra ela praticado apresentaram
coerência e harmonia e foram devidamente corroboradas por outras provas,
tal como a prova pericial acostada aos autos. [...] No caso, restou devidamente
demonstrado que houve ofensa à integridade física da ofendida, com seu
comprometimento anatômico em decorrência da conduta dolosa praticada pelo
acusado, consistente na consciência e vontade de causar lesão corporal. Quanto ao
fato 02 a ofendida declarou “se recorda que as agressões perpetradas pelo acusado
ocorreram cerca de 02 (duas) vezes; quando brigavam havia tapas por parte do réu;
se recorda de ter sido agredida fisicamente”. Do mesmo modo no que tange ao fato
04, verifica-se que em ambas as oportunidades em que foi ouvida (movs. 7.10 e
152.2), a ofendida assegurou que no momento do delito havia uma discussão
entre ela e o réu, sendo que o mesmo entrou no automóvel, ela se aproximou
dele para conversar, mas o réu acelerou bruscamente o carro, atingindo-a. De
fato, é cediço que nossos Tribunais, e a doutrina fartamente tem assentado, que em
crimes contra a pessoa, a palavra da vítima assume relevante papel probante ao
identificar os autores do ilícito e descrever a cena do crime, desde que
coerente e firme, devendo ser utilizada como meio de prova válida, mormente
quando encontra harmonia com os demais elementos probatórios. [...]
Ademais, oportuno relembrar que nos delitos ocorridos no âmbito doméstico,
envolvendo violência contra a mulher, o exame de corpo de delito é prescindível,
podendo a materialidade ser comprovada por outros meios de prova. Não obstante,
no caso em tela somado à palavra da ofendida e depoimentos colhidos, há prova
pericial produzida acostada aos autos que atestam as lesões suportadas pela
ofendida em decorrência de violência física praticada. Quanto ao fato 02 - foi
juntado aos autos o laudo de lesões corporais, no qual consta as seguintes
informações: HISTÓRICO: Conta ter sido vítima de agressão física, no dia 02/12
/2016. EXAME OBJETIVO Ao exame ora realizado, apresenta: a) três escoriações
semilunares, medindo 0.5 cm casa uma delas, na face anterior esquerda do
pescoço; b) três escoriações lineares, medindo 1,0 cada uma delas, no braço e
antebraço à direita; c) equimose arroxeada irregular, medindo 3,5 cm, no braço à
esquerda; d) duas equimoses arroxeadas irregulares, medindo 12,0 cm e 6,0 cm, no
joelho à esquerda e à direita. RESPOSTA AOS QUESITOS Ao primeiro: Há ofensa
à integridade corporal ou à saúde do paciente? Resposta: Sim. Ao segundo: Qual o
instrumento ou meio que a produziu? Resposta: Instrumento contundente –
agressão física. […] (mov. 7.7). Consta nos autos também as fotografias das lesões
apresentadas pela vítima em decorrência das lesões sofridas (mov. 10.6). Quanto
ao fato 04: foi juntado aos autos o laudo de lesões corporais, no qual consta as
seguintes informações: HISTÓRICO: Conta ter sido vítima de agressão física, no dia
18/10/2017, às 02:00 hs. EXAME OBJETIVO Ao exame ora realizado, apresenta: a)
curativo de gaze e esparadrapo na região clavicular à esquerda; b) dor e limitação
dos movimentos no ombro à esquerda; c) membro superior esquerdo na tipóia de
tecido; d) escoriação irregular medindo 2,0 cm na região parietal à esquerda; e) oito
escoriações irregulares, as três maiores delas medindo 20 cm, 8 cm, e 6 cm, na
coxa, joelho, perna e pé esquerdos e no joelho direito. RESPOSTA AOS
QUESITOS Ao primeiro: Resultou incapacidade para as ocupações habituais por
mais de trinta dias; ou perigo de vida, ou debilidade permanente de membro ou
função? Resposta: Sim, resultou em incapacidade para as ocupações habituais por
mais de trinta dias. Ainda, tem-se juntado aos autos as fotografias das lesões
sofridas pela vítima, com ferimentos espalhados pelo corpo, evidenciando o trauma
sofrido pelo atropelamento (mov. 7.11). Deste modo, restou demonstrado aos
autos o animus laedendi por parte do réu que causou lesões corporais na
vítima, como exibidas nos laudos e fotografias acostadas ao feito. [...] [...]
FATO 04 - Com base nas informações carreadas nos autos, percebe-se que a
versão apresentada pelo réu não coaduna com lesões apresentadas pela vítima.
Como bem exposto pelo representante ministerial "as diversas lesões espalhadas
pelo corpo da ofendida denotam que foi atingida com elevada força e velocidade”
(mov. 22.1 – TJPR). Por sua vez, a vítima Cláudia, nas duas vezes em que foi
ouvida, em momento algum relatou que estava tentando alcançar a maçaneta do
automóvel quando foi atingida, antes pelo contrário, foi uníssona em afirmar
que o réu Eduardo arrancou com o veículo enquanto ela se aproximava para
com ele conversar (mov. 152.2) ”. Assim sendo, a Defesa não apresentou
nenhuma versão coerente aos autos. E, para que um álibi enseje dúvida sobre a
incriminação ou sua exclusão, se exige prova a ser produzida por quem o
invoca (CPP, art. 156, 1º parte) e o apelante, ora acusado, não comprovou suas
assertivas. Pela evidência do conjunto probatório, é impossível aceitar a versão
apresentada pela defesa, posto que os álibis não restaram comprovados, ao
contrário, foram destituídos pelos informes dos autos’” (E.D., mov. 22.1, fls. 5/6).
A decisão da Corte Paranaense não destoa do entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto a
importância da palavra da vítima, nos crimes desta natureza:
“‘É firme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que, em crimes
praticados no âmbito doméstico, a palavra da vítima possui especial relevância, uma
vez que, em sua maioria, são praticados de modo clandestino, não podendo ser
desconsiderada, notadamente quando corroborada por outros elementos
probatórios’ (AgRg no AREsp 1003623/MS, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA
TURMA, julgado em 01/03/2018, DJe 12/03/2018). (...) (STJ - AgRg nos EDcl no
AREsp 1256178/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA
TURMA, julgado em 22/05/2018, DJe 04/06/2018).
“A jurisprudência desta Corte é assente no sentido de que, em se tratando de
crimes praticados no âmbito doméstico, a palavra da vítima tem valor probante
diferenciado, desde que corroborada por outros elementos probatórios, tal como
ocorrido na espécie” (AgRg no AREsp 1495616/AM, Rel. Ministro RIBEIRO
DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe 23/08/2019).
Logo, a decisão Colegiada está em harmonia com a jurisprudência da superior instância, o que afasta a
possibilidade de admissão do recurso especial, considerando o teor da Súmula 83 do Superior Tribunal de
Justiça, segundo a qual: “Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do
tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida”.
Ressalta-se que, “O óbice contido no Enunciado n.º 83 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça também
se aplica ao recurso especial interposto com base na alínea a do inciso III do art. 105 da Constituição da
República. Precedentes” (AgRg no AREsp n. 2.209.260/SE, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma,
julgado em 13/12/2022, DJe de 19/12/2022).
O mesmo se diga em relação aos artigos 155 e 156 do Código de Processo Penal:
- Artigo 155 do Código de Processo Penal:
“Com efeito, no processo penal brasileiro, em consequência do sistema da
persuasão racional, o juiz forma sua convicção "pela livre apreciação da prova" (art.
155 do CPP), o que o autoriza a, observadas as limitações processuais e éticas que
informam o sistema de justiça criminal, decidir livremente a causa e todas as
questões a ela relativas, mediante a devida e suficiente fundamentação” (AgRg no
AREsp 1609616/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA,
julgado em 22/09/2020, DJe 01/10/2020).
- Artigo 156 do Código de Processo Penal:
“Inexiste inversão do ônus da prova quando a acusação produz arcabouço
probatório suficiente à formação da certeza necessária ao juízo condenatório”.
(AgRg no AREsp 381.524/CE, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA,
julgado em 17/04/2018, DJe 25/04/2018).
“Quanto à violação do disposto no art. 156 do CPP, as instâncias de origem
decidiram em consonância com a jurisprudência desta Corte, segundo a qual cabe à
defesa a comprovação de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos da pretensão
acusatória” (AgRg no AREsp n. 2.126.673/DF – Rel. Min. OLINDO MENEZES – 6ª
T. – DJe de 17/10/2022).
Outrossim, depreende-se do acórdão que o Colegiado Estadual concluiu estar comprovada as condutas
delitivas, consubstanciada em elementos fáticos-probatórios obtidos durante a instrução judicial, panorama
que afastou, outrossim, o acolhimento da súplica absolutória.
Logo, eventual análise de tais provas, a fim de aferir a conclusão contrária à da Corte Estadual, implica em
reexame dos elementos colecionados nos autos, caracteriza-se medida inexequível na via do recurso
especial, em razão do contido no enunciado nº 7 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.
Sobre o tema o Superior Tribunal de Justiça decidiu que:
“A alegação de inexistência de provas para a condenação demanda o revolvimento
do conteúdo fático-probatório dos autos, providência inadmissível na via do recurso
especial. Incidência do enunciado n. 7 da Súmula desta Corte” (AgRg no AREsp
991.046/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA,
julgado em 03/08/2017, DJe 16/08/2017).
“A absolvição do acusado, baseada na insuficiência de provas ou na atipicidade
da conduta, demandaria necessariamente nova análise do conjunto fático-
probatório dos autos, providência inviável em sede de recurso especial, a teor do
que dispõe a Súmula 7/Superior Tribunal de Justiça” (AgRg no AREsp 1739684/SP,
Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 15/12/2020, DJe 18
/12/2020).
Salienta-se, ainda, que “o recurso especial também não pode ser conhecido com fundamento em
divergência jurisprudencial, porquanto prejudicado dada a impossibilidade de análise da mesma tese
desenvolvida pela alínea a do permissivo constitucional pela incidência de óbices de admissibilidade” (AgInt
no REsp n. 1.912.329/SP, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 13/2/2023,
DJe de 17/2/2023).
Diante do exposto, inadmito o recurso especial.
Intimem-se.
Curitiba, data da assinatura digital.
Desembargadora JOECI MACHADO CAMARGO
1ª Vice-Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná
AR18